Por trás dos vínculos entre policiais corruptos e filho do presidente talvez estejam as respostas para a execução de Marielle Franco e Anderson Gomes

Em 14 de março de 2018, a então vereadora pelo PSOL da cidade do Rio de Janeiro Marielle Franco e seu motorista Anderson Gomes foram executados. Jair Bolsonaro foi eleito presidente do Brasil em 28 de outubro do mesmo ano. Três semanas antes, no dia sete daquele mês, Flávio Bolsonaro, seu filho primogênito, também venceu uma disputa eleitoral: a de senador pelo estado do Rio de Janeiro. Já em 2019, no dia 22 de janeiro, a operação “Os Intocáveis”, levada a cabo por grupos do Ministério Público do Rio e da Polícia Civil fluminense, cumpriu diligências na zona oeste da cidade carioca, com 13 mandados de prisão preventiva contra membros da milícia “Escritório do Crime”, formada por policiais e pistoleiros que exploram moradores da comunidade Rio das Pedras, também localizada naquela região, e que, segundo o MPRJ, atuam como matadores por encomenda.
Imagem:O.RIBS ( @o.ribs no Instagram)
Dos mandados expedidos pela justiça fluminense, dois personagens têm pesos substanciais para a investigação por suas posições na hierarquia do “Escritório” e pelos laços com a família mais importante do País: a do presidente da República.

Descobriu-se com a operação que um dos chefes da milícia, o major da ativa da Polícia Militar Ronald Paulo Alves Pereira, que foi preso pela polícia civil, havia sido homenageado por Flávio Bolsonaro em 2004, três meses após Pereira ter participado de uma chacina com quatro mortos. Flávio Bolsonaro estava apenas em seu primeiro mandato e foi autor da “moção de louvor e congratulações [...] pelos importantes serviços prestados ao Estado do Rio de Janeiro quando da operação policial realizada no Conjunto Esperança [...] onde três destes vieram a falecer” (confira aqui a íntegra do documento).

Bom, o outro personagem é o ex-capitão do Batalhão de Operações Especializadas – Bope, Adriano Magalhães da Nóbrega. Foragido, Nóbrega foi ainda mais longe que Ronald em todos os aspectos analisáveis. Além de ser considerado chefe da milícia do Rio das Pedras, principal grupo paramilitar estado do Rio de Janeiro e organização que deu origem ao “Escritório”, do qual também é homem-forte, o ex-capitão teve sua mãe e esposa alocadas em cargos e funções no gabinete de Flávio Bolsonaro até o dia 13 de novembro de 2018, e foi preso por homicídio ainda na década passada.
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Enquanto Danielle Mendonça da Costa, esposa de Adriano, foi nomeada em 2007, Raimunda Veras Magalhães, mãe do ex-Bope, ganhou seu cargo no gabinete do hoje senador eleito em 2015. As nomeações foram feitas por Fabrício Queiroz, segundo nota divulgada pela defesa técnica do próprio.
 
Ainda segundo a nota, Queiroz, hoje investigado pela prática de “rachadinha” ainda no gabinete de Flávio, “se solidarizou com a família que passava por grande dificuldade, pois à época ele estava injustamente preso, em razão de um auto de resistência que foi, posteriormente, tipificado como homicídio”. Essa teria sido a justificativa para a contratação de Danielle em 2007. Sobre a mãe de Adriano, preso em 2011 por suspeitas de associação com a máfia de caça-níqueis e exoneração da PM em 2014, a nota do ex-assessor de Flávio não apresentou explicação, assim como não falou sobre a operação “Os Intocáveis” e acerca dos dados de relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras – COAF que apontam depósitos da mãe de Adriano a sua conta bancária.

A participação de policiais em organizações criminosas, sobretudo em milícias, impede o avanço de investigações, já que o corporativismo é mais forte quando da apuração e eventuais condenação de pares. Passado dez meses da execução de Marielle Franco e de seu motorista, Anderson Gomes, são muitos os questionamentos acerca do trabalho da Delegacia de Homicídios da cidade do Rio de Janeiro, que estaria colocando obstáculos para o esclarecimento do caso. Tanto é que reportagens questionando a relação de milicianos da zona oeste, mesma região das milícias do Rio das Pedras e Escritório do Crime, e poucas respostas foram dadas. Isso, em um estado que passou todo o ano passado sob intervenção federal na área de segurança pública e que elegeu um ex-juiz federal como governador e contribuiu, e muito, para a eleição de seu deputado federal por quase três décadas como presidente da República.
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Fato é que, apesar de a operação “Os Intocáveis” ser tocada pelo Ministério Público e Polícia Civil, sem qualquer participação legal da equipe que investiga o caso Marielle, a prisão de Ronald, a busca pelo foragido Adriano e a possível relação deles com a execução da então vereadora do PSOL, por conta dos cargos que desempenhavam no tal “Escritório”, insere o gabinete do então deputado estadual Flávio Bolsonaro em um “rolo” ainda maior.

A considerar que a nota enviada à imprensa por Queiroz não comenta sobre a ligação do próprio com Adriano e sua família – apenas explica as razões que cercam a nomeação da esposa do ex-capitão –, a abrangência do “rolo” atinge, inclusive, o casal Jair e Michelle Bolsonaro. O presidente disse, sem muito aprofundamento, que emprestou 40 mil reais para Fabrício Queiroz e que, por isso, o ex-assessor de Flávio Bolsonaro teria repassado um cheque no valor de 24 mil reais para a primeira-dama. Queiroz, por sua vez, foi responsável pela nomeação de familiares do ex-capitão foragido.

Explicações faltam aos montes.

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Claudio Porto

Jornalista independente.

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