“O
que eu tenho a ver com isso?”, diz Bolsonaro
Com indiferença ímpar, Paulo Jardim, delegado responsável
pelo caso, disse que “o desenho que
fizeram na barriga dela é um símbolo budista, de harmonia, de amor, de paz e de
fraternidade”. “Se tu fores pesquisar
no Google, tu vai ver que existe um símbolo budista ali. Essa é a
informação" afirmou em entrevista à BBC News Brasil.
Os primeiros dias após o 1º turno das eleições apresentaram como saldo o assassinato do mestre capoeirista Moa do Katendê, em Salvador;
relatos de agressões a torto e a direito, inclusive com a incisão de uma suástica na
altura da costela de uma garota de 19 anos;
espancamentos contra homossexuais e, até quinta-feira (11) – como
informa o jornal Folha de S. Paulo –,
2,7 milhões de tweets, nome dado às
postagens na rede social Twitter,
relacionados aos casos de violência física e repercutindo os relatos de ameaças
e ofensas por motivação política. O grupo que idolatra o dito mito Jair
Bolsonaro (PSL) não preza pela aceitação do contraditório, como orienta a boa
cartilha de práticas democráticas, e, vislumbrando uma vitória do capitão da
reserva com sua trupe de políticos até pouco tempo inexpressivos, iniciou uma
caçada àqueles que julga serem inimigos que devem ser aniquilados. Até o
momento em que este artigo estava sendo editado, nenhum caso de violência
contra bolsonaristas havia sido registrado pela imprensa. Mesmo assim, este
texto trata, mais abaixo, de um levantamento da Agência de Jornalismo Investigativo Pública, no qual aparecem números
gerais da violência, inclusive contra militantes de Bolsonaro.
Doze facadas desferidas por Paulo Sérgio Ferreira de Santana,
eleitor e militante assumido de Bolsonaro, levaram a morte de Moa Katendê, fundador do Afoxé Badauê. A confusão, em um bar da
periferia de Salvador, começou quando o mestre declarou em quem havia votado no
domingo (07). Como os números apertados por Katendê na urna não foram o um e o sete,
Santana se viu revoltado e no direito de buscar a pecheira em casa e,
friamente, “eliminar o inimigo”. De acordo com a Secretaria Estadual de
Segurança Pública da Bahia, ele estava com as malas prontas quando da prisão.
No Paraná, um estudante da Universidade Federal do Paraná – UFPR foi espancado por um grupo de
quatro integrantes de uma torcida organizada de Curitiba. Aos gritos de “Aqui é Bolsonaro!”, os rapazes
recorreram a garrafas de vidro para atacar o jovem que trajava um boné do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra – MST.
Já em Porto Alegre, uma jovem de 19 anos, que vestia camiseta em referência ao
movimento “Ele Não” de oposição à
candidatura de Bolsonaro e carregava uma mochila com enfeites em referência ao grupo LGBTQI, foi agredida por três homens. Eles a socaram e
desenharam em seu corpo, com um canivete, o símbolo nazista da suástica.
Foto: Reprodução / Facebook |
Foto: Reprodução / Facebook |
Após o posicionamento de Jardim, a defesa da jovem decidiu,
por agora, não abrir representação contra os suspeitos, que ainda não foram
identificados, e focar na reabilitação da vítima que está traumatizada. Apesar
disso, a polícia civil gaúcha encomendou um laudo pericial para explicar, ao
menos, como teria sido feito o corte, já que questionam o fato de o desenho estar de ponta-cabeça. Ainda assim, com o caso suspenso, o
delegado não esconde que, mesmo sendo um representante do Estado, escolheu e defende um lado.
Ao portal UOL, disse que “ela [a jovem] decidiu não representar, veio acompanhada dos três advogados e não tem
interesse de seguir [com a ação], que
vai ficar com a vida dela em paz, tranquila”.
Em Pernambuco, informa a Folha,
uma servidora pública foi espancada por outra mulher em um restaurante do Recife também porque votou em um candidato que não Bolsonaro. Neste
caso, o presidenciável escolhido pela vítima foi Ciro Gomes (PDT), do qual ela portava bottons e adesivos. Enquanto a
bolsonarista agredia, ainda de acordo com informações do jornal, garçons do
restaurante foram imobilizados pelos companheiros da agressora.
Mais recentemente, na sexta-feira (12), bolsonaristas
travestidos de católicos intimidaram o padre que ministrava uma missa em
homenagem ao Dia de Nossa Senhora Aparecida, em que estava o candidato Fernando Haddad (PT). Em um
vídeo – que reproduzo abaixo –, críticas são feitas ao pároco porque Haddad e Manuela
D’Ávila, candidata à vice-presidente do Brasil na chapa petista, receberam a hóstia como os demais fiéis.
Vídeo: Reprodução / Canal Diário do Centro do Mundo, no Youtube
Além de civis, os ataques se estendem também a jornalistas,
profissionais da informação. De acordo com Agência
Brasileira de Jornalismo Investigativo – ABRAJI, 137 casos de violência contra
esse grupo foram registrados. Desse número, 62 foram ataques contra a
integridade física. No mais recente, um estagiário do jornal Folha de Pernambuco foi atacado por um
motoqueiro na região central do Recife. O jovem levou um tapa na cabeça e ouviu
do agressor: “essa raça vai acabar, viu?”.
O estudante de jornalismo é homossexual.
Ainda em Pernambuco, uma jornalista do Sistema Jornal do Commercio de Comunicação (SJCC) prestou queixas
na delegacia denunciando ter sido atacada por dois militantes de Jair Bolsonaro
– inclusive havia um vestindo camiseta com o rosto do presidenciável – ao
sair de seu local de votação, ainda no domingo (07). Ela foi agredida e ouviu
ameaças de que seria estuprada.
Charge: Gilmar, o "Cartunista das Cavernas" |
A Agência de
Jornalismo Investigativo Pública, em parceria com a Open Knowledge Brasil, elaborou um levantamento, em que aponta para
ao menos 70 ataques nos últimos dez dias em todo o País. Segundo o documento,
50 deles foram praticados por bolsonaristas, enquanto seis teriam sido
cometidos por defensores da candidatura de Haddad. Quinze
agressões de situações indefinidas foram contabilizadas pelo estudo.
Quando Bolsonaro diz que vai “fuzilar” oponentes políticos,
seja eles do PT ou não, deve receber, de imediato, o repúdio dos defensores de fato da democracia. O mesmo vale para
quando afirma que negros quilombolas “não servem nem para procriar” ou que, em
um eventual governo seu, vai “botar um ponto final nesse ativismo xiita”. Isso,
entre outras frases que não são polêmicas e sim criminosas, legitima o ato dos bárbaros de plantão.
Charge: Renato Aroeira |
Não há um discurso sequer de Bolsonaro em que não incite
seus militantes. Até mesmo quando foi se posicionar quanto ao assassinato de
Moa, o capitão da reserva disparou que ele é quem havia levado uma facada e que
nada tinha a ver com o caso. No mais alto grau de sua impessoalidade e
irresponsabilidade, já que é uma figura pública, soltou um “o que eu tenho a ver com isso? Eu lamento”, eximindo-se da culpa.
No último domingo (14), Bolsonaro voltou a falar em
criminalizar movimentos sociais, como o MTST
e MST, e prometeu porte de armas de fogo para famílias
se defenderem de invasões. Desta vez, as propostas vieram na esteira de um entrevero entre o capitão da reserva e o ex-candidato à Presidência da República pelo PSOL, Guilherme Boulos. O ex-presidenciável, discursando em um recente ato político em São Paulo, respondeu ao público sobre ocupar a casa do candidato do PSL. Ironicamente, Boulos afirma
que o movimento do qual é coordenador só ocupa espaços improdutivos e a
residência do presidenciável do PSL
parece ser improdutiva.
A busca pelo diálogo e por soluções que alcancem a maior
parte da sociedade surge como obrigação inerente à função de presidente da
República. Assim como tecer críticas a postulações diversas e se colocar à
oposição, se necessário, fazem parte do bom debate de ideias e da democracia,
propriamente dita. O voto em Bolsonaro parece não respeitar isso. Ele
desconsidera e faz pouco caso das diferenças, e lança mão da doutrinação, tão
temida e razão de discussões acalorados pelas bandas da extrema-direita, para
alcançar seus objetivos.
O respeito à diferença e, consequentemente, ao contraditório
é principio básico não apenas para ser presidente do Brasil ou de qualquer outra nação,
mas para viver bem em sociedade.
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