Dias obscuros e
cruéis são frutos deste quase dois anos de (des)governo Temer
Apesar de os últimos dias carregarem todos os aspectos de que
alcançamos o ápice do colapso, eles não foram diferentes de todos os outros que
compuseram os últimos dois anos. Desde maio de 2016, quando concretizou a
conspiração pela saída da ex-presidente Dilma Rousseff, a ordem natural do País
foi abruptamente obrigada a abandonar o caminho do progresso, de combate à
pobreza e fortalecimento da rede de seguridade social – obviamente que também
haviam demandas não atendidas -, e voltar a trilhar um caminho que conhecemos
estar obsoleto, mas que resiste sendo utilizado como cartilha por alguns grupos
da sociedade. Falo do papo-furado de
“neoliberalismo” e do discurso de ódio, o mesmo que sustentou períodos como o do
Terceiro Reich, e sua Alemanha
Nazista, que agora se potencializa com as redes sociais, enquanto brasileiros
são roubados, deixam de ter o direito à vida.
A agenda do mesmo neoliberalismo entreguista do tempo de
Thatcher e do Conselho de Washington, ambos do século passado, e o uso de
ferramentas de comunicação para difamar, ofender, violentar e arrasar vidas
alheias é uma realidade brasileira. E infelizmente, a isso vem se somando
vítimas fatais. Crianças, idosos, civis, políticos, agentes de segurança e
criminosos se amontoam sob os pés sujos, para não dizer imundos, de autoridades
que tomam decisões equivocadas.
A execução
bárbara da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes (clique!),
no Rio de Janeiro, ainda na semana, trouxe à tona a violência que domina a rede
mundial de computadores há tempos. O ódio e a reprodução de fake news após a
morte da vereadora, que era ativista dos Direitos Humanos, além de ter sido uma
pessoa pública, infelizmente é comum e tem muito espaço, principalmente, nas
redes sociais. É um fenômeno que atinge a todos, sem distinção de classe social
e grau de instrução. Veja que entre os perfis usados para disseminar injúrias
contra a vereadora estão a de um artista, o cantor Zezé Di Camargo, um
político, o deputado pelo Democratas do
Distrito Federal, Alberto Fraga (DEM-DF) e um perfil de uma magistrada, a
desembargadora carioca Marilia Castro Neves.
Figuras públicas que, acompanhados de mais alguns milhares
de usuários, soltaram suas “feras”, todo o ódio que guardam e carregam com elas.
E isso não para neles. Para tanto, vamos de empresários como
Flávio Rocha, proprietário da rede Riachuelo,
que descumpre leis trabalhistas e prega o liberalismo – o fim da figura do
Estado na economia – sem dar-se conta de que ele mesmo toma empréstimos com
juros subsidiados pelo Estado no Banco
Nacional do Desenvolvimento Social, o BNDES,
ao presidente da República, duas vezes denunciado por corrupção, que sobrevive
no poder apenas por se dispor como figura favorável ao fim de políticas
sociais, o que agrada setores da sociedade como o mercado financeiro, e mais
recentemente, já observando possíveis ganhos políticos, interveio na Segurança
Pública do Rio.
A intervenção eleitoreira e marqueteira de Temer no estado
do Rio de Janeiro pode até ser nova, inédita, mas as práticas são velhas. Quando observou que não teria os 308 votos
suficientes para aprovar a contrarreforma da Previdência, o presidente Temer e
seu (des)governo mudou o foco e, alertados pela TV Globo, que “gritava” com imagens de arrastões e assaltos durante
o carnaval carioca, aproveitou para anunciar o general do exército Walter Braga
Netto como interventor e criou mais um ministério, o Extraordinário da
Segurança Pública. É bom dizer que as imagens de violência, com a brutalidade de criminosos, são realmente revoltantes, mas nunca solucionáveis por
uma intervenção sem planos, como a de Temer.
Veja os últimos dias, já sob intervenção, e as muitas
vítimas, desde as execuções
da vereadora Marielle Franco (PSOL-RJ) e de Anderson Gomes (clique!) aos
assassinatos posteriores em que, mais uma vez, crianças e cidadãos civis foram
– e estão sendo - mortos por bala perdida, fruto da política de enfrentamento
em locais abertos, em sua grande maioria dentro de comunidades pobres, que é
praticada pelas forças policiais do País há anos. Sem usar de inteligência,
investigação e cooperação entre as forças de segurança e defesa, o Brasil
estabeleceu no Rio, injusta e cruelmente, seu campo de guerra.
Campo de guerra que está sendo usado pelo (des)governo Temer
para emplacar um candidato em outubro, e por haters e usuários comuns nas redes
sociais para difundir ideias infundadas, desconexas com a realidade e, se
minimamente analisadas, que se contradizem, como a revogação do estatuto do
desarmamento, ventilado com mais força no Congresso após a intervenção no Rio,
que colocaria mais armas em circulação como combate a violência, quando o que
vemos é o tráfico de armas, contando com extravios de dentro das instituições
públicas de segurança, aumentando exponencialmente.
De uns anos para cá, o movimento não é mais apenas pelo
tráfico de drogas e sua manutenção. Hoje, parece haver consenso entre os
criminosos de que o tráfico de armas é mais rentável, já que a política de
segurança sempre focou mais no enfrentamento, com “caveirões” e homens
literalmente em linha de combate subindo os morros ou tomando as comunidades,
ou em remediar a consequência, ou seja, iniciar investigações após o
crime concebido, e não estabelecer projetos que envolvam fiscalização das
fronteiras, o uso de inteligência de rastreamento e controle interno de
armamento e munição, que seriam barreiras não apenas para o tráfico de drogas –
já que decidimos por criminalizá-las -, mas também para os novos ativos do
comércio criminoso: armas e munições que, quase sempre, são de uso exclusivo
das forças de segurança. Ou ao menos deveriam ser.
Imagem: QUADRINSTA (@Quadrinsta no Instagram e no Twitter) |
O crime bárbaro envolvendo a Marielle Franco e Anderson
Gomes, na quarta (14), segundo as investigações, foi realizado com munições
compradas pelo Estado brasileiro, ou seja, pagas pelo povo brasileiro. As
mortes que vieram depois, do garoto Benjamin, de um ano e sete meses, atingido
na cabeça por bala perdida enquanto esperava, em um carrinho de bebê, a mãe
comprar um algodão doce; da Maria Lúcia da Costa, de 58 anos, e do José Roberto
Ribeiro da Silva, de 54 anos, mortos em meio à troca de tiros no Complexo do Alemão
na sexta (16), dois dias após o crime envolvendo a vereadora, logo menos também
cairão na conta das forças policiais. Infelizmente, é quase inevitável presumir
que a investigação – se é que haverá – aponte como sendo da polícia as munições
que atingiram os civis, incluindo mais uma criança.
No caso do Complexo do Alemão, talvez o disparo não tenha
sido feito por um dos policiais que atendiam a ocorrência, e sim por um dos
criminosos que revidavam com tiros. Digo, como garantir que a munição usada pelos
criminosos na ação, assim como no caso de Marielle, não teria sido também
extraviada? Estamos vendo munição comprada para ser usada por policiais em
defesa do cidadão sendo utilizada para matar civis inocentes.
Inocentes que não param de morrer. Ainda no final de semana
pós-execução de Marielle Franco e, sempre bom relembrar, sob intervenção do
(des)governo Temer, uma garota de 13 anos e um homem, com identidades não
reveladas, morreram atingidos por disparos.
Enquanto escrevia este artigo, ainda na manhã de segunda (19), o idoso
Luiz Carlos Pereira Viana, de 61 anos, morreu após tentativa de assalto em uma
loja no centro da capital carioca.
O presidente Temer pretendia realizar um evento, certamente de marketing político, no domingo
(18) para comentar indicadores da intervenção no
primeiro mês. Com a morte e a comoção envolvendo a vereadora Marielle Franco e
Anderson Gomes, que levou milhares de pessoas às ruas, ele voltou atrás – ufa! -
e não viajou ao Rio.
Não viajou, mas, de Brasília, anunciou crédito extraordinário
de mais de quatro bilhões de reais para o Ministério da Segurança Pública,
sendo um bilhão de reais exclusivo para a intervenção no Rio. O general-interventor
Braga Netto bateu não continência, mas a botina pedindo mais dinheiro. Para o
general, um bilhão de reais é pouco e pede, no mínimo, três bilhões de reais. Apesar
da reclamação, o valor será “apenas” de um bilhão de reais. Serão investidos mais
de um bilhão de reais em ações que não se traduzem em resultados que não mais
enfrentamento e mortes.
Já que somente Temer e sua turma “curtem” a intervenção, que
se intervenha o (des)governo.
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