Podemos pensar que, talvez, a única novidade que temos para mais este momento eleitoral é a pandemia.


Olhando para a oferta de candidatos, para as legendas partidárias e para os modelos de propaganda, tudo nos parece “normal”. Uma infinidade de nomes fantasias, jingles duvidosos (se os direitos autorais fossem uma matéria séria no Brasil, muitos políticos seriam processados por uso indevido de melodias), pessoas entregando propagandas nas ruas (desrespeitando, neste momento, o distanciamento social), candidatos nas ruas acenando e tentando conversar com as pessoas (devido à pandemia, não se pode abraçar e muito menos pegar crianças no colo), tudo isso, é claro, destinado a uma plateia que só é considerada importante em intervalos de quatro anos: os eleitores.

As eleições presidenciais saltam-nos aos olhos mais do que as municipais, eleger o chefe do Estado pensando naquilo que lhe é atribuído parece ser mais importante que eleger prefeitos e vereadores, e, de certa forma, pode ser. Entretanto, se pensarmos que as cidades antecedem a criação do Estado e que a vida concreta acontece nas cidades, percebemos que o Estado é mais uma abstração ou uma demarcação de limites territoriais. 

Se partirmos da premissa de que as cidades são o país real, podemos lhes atribuir importância preponderante no fazer social, onde as realizações políticas e econômicas acontecem, atribuindo, assim, sentido à organização da vida dos cidadãos. 

Segundo o Tribunal Superior Eleitoral, mais de 140 mil cidadãos estarão aptos a votar e 95 cidades poderão ter segundo turno [1], com a estimativa de que 750 mil candidatos disputarão as vagas dos poderes municipais. O primeiro calendário eleitoral estava agendado para 4 de outubro, mas, devido à pandemia, o Congresso Nacional votou pelo adiamento do pleito, ficando este para o dia 15 de novembro, com segundo turno, se necessário, para o dia 29 do mesmo mês. 

Historicamente, processos eleitorais brasileiros são um misto de descrença e esperança para boa parte da população. Em momentos como o que estamos vivendo, em que a polarização elegeu um presidente que se apresenta como conservador, os resultados das eleições municipais podem ser o termômetro do cenário que se coloca para os próximos anos. 

Passando os olhos pelas pesquisas de algumas das cidades economicamente mais importantes do país, podemos perceber que configuração ideológica poderá se afirmar nas possíveis administrações. Em Porto Alegre, Manuela D’Ávila, do PC do B, possui 27% das intenções em Porto alegre; em São Paulo, Celso Russomanno, dos Republicanos, possui 25% das intenções; no Rio de Janeiro, Eduardo Paes, do DEM, está com 30% das intenções; em Belo Horizonte, Alexandre Kalil, do PSD, com 59%, e, em Salvador, Bruno Reis, do DEM, está com 42% das intenções [2]. Dos cinco candidatos elencados, apenas um configura no espectro da esquerda. Nesse sentido, poderíamos pensar que esse fato é um reflexo do que ocorreu nas eleições presidenciais em 2018? 

A pesquisa de intenções de voto para as eleições municipais de 2020, realizada pelo IBOPE, apontou uma porcentagem considerável tanto de pessoas que votarão em branco ou nulo como de pessoas que não sabem em quem votar, apresentando os percentuais de 13 a 28% para brancos ou nulos e de 7 a 11% para os indecisos. 

O dia das eleições se aproxima, as movimentações dos candidatos à caça de votos se intensificam em todos os meios midiáticos, as redes sociais estão em ebulição, expelindo ódio para todos os lados, e velhas práticas sobrevivem à história, parecendo que os coronéis ainda recebem a benção pelas ruas. Será que depois de tantos anos de períodos republicanos, muitas vezes interrompidos, ainda teremos que concordar com Vitor Nunes Leal, quando diz que somos um “volumoso contingente de eleitores incapacitados para o consciente desempenho de sua missão política”? [3]


* Texto revisado por Adriana Alaíde Sühnel dos Santos.


Referências

[1] G1. Eleições 2020: conheça regras e saiba o que candidato e eleitor podem e não podem fazer <https://g1.globo.com/politica/eleicoes/2020/noticia/2020/09/12/eleicoes-2020-conheca-regras-e-saiba-o-que-candidato-e-eleitor-podem-e-nao-podem-fazer.ghtml>

[2] IBOPE. <https://www.ibopeinteligencia.com/eleicoes/?ano=2020&local=Porto+Alegre%3ARS%3ABrasil>

[3] Leal, Victor Nunes. Coronelismo, enxada e voto: o município e o regime representativo no Brasil. Editora Companhia das Letras, 2012.

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Manoel Rodrigues

Graduado em Ciências Sociais Bacharelado pela PUCRS; Graduando em Ciências Sociais Licenciatura pela UFRGS; Trabalhador de base dos Correios (ECT).

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