Durante sabatina à Globo News, o candidato reconduziu alguns dos entrevistadores à “caixinha”, morada do bom jornalismo

Nitidamente incomodado com o noticiário político do final da tarde e início da noite de quarta-feira (01), o candidato à Presidência da República pelo Partido Democrático Trabalhista – PDT, Ciro Gomes, esteve no programa Central das Eleições 2018, do canal de notícias Globo News, para ser entrevistado por nove jornalistas da emissora. Por quase uma hora, no início do programa, Ciro teve de explicar os movimentos que levaram PT e PSB se unirem em troca de acordos estaduais, o que deixou sua candidatura esvaziada e isolada com pouco tempo de programa eleitoral na rádio e TV. O presidenciável mostrou-se indignado com o ataque velado de petistas contra sua candidatura, segundo o jornal Folha de S. Paulo coordenado pelo ex-presidente Lula da cela em Curitiba, e repetiu algumas vezes: “não sei o que eu fiz para merecer essa hostilidade”. Ciro Gomes foi ministro de Estado no primeiro governo Lula, o qual apoiou “todos os dias, sem faltar um”, e iniciou esta campanha como o candidato ideal em uma, hoje improvável, união de siglas da esquerda política. Ciro e Cia. não colaboraram, assim como Lula e Cia. também não. 
Imagem: Charge de Paixão
Das dependências da Polícia Federal em Curitiba, Lula teria orquestrado o isolamento político de Ciro que, compreensivelmente indignado, não viu saída a não ser criticar, de maneira inédita nesta campanha, a posição do PT. Aos jornalistas da Globo News, Ciro afirmou que a manutenção da candidatura do ex-presidente coloca o Brasil em “uma valsa à beira do abismo”, e chamou de “caudilhismo do mais barato” a convocação de João Pedro Stedile, coordenador nacional do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra – MST, para que manifestantes adiram greve de fome pelo direito de Lula ser candidato à presidente da República.

As críticas ao ex-presidente e aos petistas se seguiriam com “Lula não é um anjo impecável, como muitos do PT acreditam, é um ser humano” e que, “se Lula se considera inocente, o Palocci é réu confesso. Comandou a economia por oito anos”, enquanto lembrava nomeações controversas como a de Henrique Meirelles para a presidência do Banco Central. Em dado momento, ainda sob indignação típica de quem se sentiu traído, o presidenciável pelo PDT desdenhou da candidatura do ex-presidente, reproduzindo o que o establishment tem apregoado sobre a situação jurídica de Lula. “Sabemos que a Lei da Ficha Limpa não permite a um condenado em segunda instância ser candidato”, disse Ciro que disparou: “não querem que eu seja o candidato que vai representar uma renovação do pensamento progressista brasileiro”.
Imagem: Charge de Clayton
Passados os questionamentos sobre o movimento de PT e PSB, a banca de entrevistadores tocou naquilo que parte da imprensa tradicional busca emplacar como “tendão de aquiles” do candidato: o seu temperamento estourado. Entre vídeos de Ciro protagonizando o que seriam situações de descontrole, como embate com manifestantes à época em que ocupava secretaria no governo de Ceará e falando em reorganizar a ordem das instituições colocando-a na “caixinha”, os jornalistas tentaram desequilibrá-lo e estigmatizar ainda mais os aspectos polêmicos, porém, esbarraram no perfil de um político experiente e distante das investigações de combate à corrupção. 

O tempo perdido com questões pessoais, que sim são importantes ao conhecimento do eleitorado, mas que guardam pouco pragmatismo – não devem ser o foco do debate –, felizmente foi compensado pela satisfatória discussão sobre ideias programáticas que, independente do rumo tomar a campanha pedetista, Ciro carrega e sabe explicar.
Imagem: Charge de Amarildo
Ciro Gomes explicou as razões para o insucesso – desastre sabido – da agenda político-econômica do (des)governo Temer, que todos naquele estúdio defendem. O candidato falou em revogar a contrarreforma trabalhista e propor outra discutindo pontos com os setores afetados: empresariado e classe trabalhadora. Ele também expôs o que será uma reforma da Previdência Social em um eventual governo.

As criticas ao sistema financeiro e a proposta de taxar lucros e dividendos incomodaram a banca que, poucas vezes aberta ao contraditório, se viu na oportunidade de voltar à “caixinha” do bom jornalismo e repensar o apoio cego às políticas retrogradas que privilegiam alguns em detrimento da maioria. O mesmo vale para os comentários do candidato sobre o combate à violência com inteligência e a retomada do patrimônio público brasileiro, espoliado pelo atual (des)governo.  

Competente e com discurso contundente, o presidenciável de 60 anos é ótimo quadro político, guarda propostas boas e é gestor público responsável. Para tanto, a coluna Painel, da edição de quinta-feira (02) do jornal Folha de S. Paulo, informa que, na terça-feira (31), durante reunião entre partidos de esquerda, o PT teria feito o convite para o PDT lançar Ciro como vice na chapa encabeçada pelo ex-presidente Lula. De acordo com o diário paulista, o convite não foi recusado, mas questionado pelo atraso da proposta, já que o candidato pedetista teve seu nome confirmado pela convenção da legenda.

Ciro tem razão quando diz que é quase certa a inelegibilidade de Lula. Por isso, caso venha a ser vice de Lula, Ciro será o candidato de fato, aquele que representará a esquerda na campanha com tempo razoável e apoio de partidos como PT, PC do B e PSB, além de seu PDT.
Imagem: Charge de Marcio Antônio Campos
Ainda incomodado, Ciro participou de um evento na Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal, em São Paulo, na tarde de quinta-feira (02). Lá, chamou a proposta petista de "aberração, porque sou candidato do PDT" e culpou o PT de ser "um dos grandes responsáveis pela tragédia que o Brasil está vivendo neste momento". Ciro ainda chamou o movimento de PT e PSB(clique!) de "providência golpista".

O PT acredita que o isolamento político de Ciro o fará pensar nessa proposta ou, ao menos, sentar para conversar. O lado de lá, como previsto por este blog no início da pré-campanha(clique!), se uniu em torno da candidatura de Geraldo Alckmin (PSDB), "Temer sem Temer"(clique!). O lado de cá, à esquerda ou progressista, como preferir, precisa, também ao menos, negociar um acordo de não agressão.  

O chamado "fogo amigo" só cai como luva quando se dá no debate de ideias, em que se corrige ou busca a revisão de posições, e não quando se dão negociações atabalhoadas com legendas que ora estão de um lado ora de outro, ou quando uma figura dispara críticas descabidas por pura irritação. 

Eles têm até o domingo, 5 de agosto, para confirmar ou não tal aliança e negociar acordos. 


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Claudio Porto

Jornalista independente.

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1 comments so far,Add yours

  1. Grande texto como sempre Claudio, como lhe disse em OFF, essa medida do PT de aos "51 do segundo tempo" "chamar" Ciro pra ser vice na chapa de Lula me parece um blefe e dos feios.

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