Manter um diálogo de alto nível nos dias de hoje é raro,
margeia a extinção. O desenvolvimento acelerado das novas mídias, o avanço e
penetração das mais variadas formas de tecnologia envolveu todos, assim como Aracne na Antiga Grécia ao desafiar a
Deusa da Guerra, Atena, numa teia
cada vez mais desesperadora.
Há 68 anos, em 1949, George Orwell, pseudônimo de um indiano
das Índias Britânicas e ex-combatente na Revolução Espanhola, publicava uma
distopia fascinante, de brilho peculiar e realismo atemporal. 1984, ao lado de Admirável Mundo Novo, de Aldous Huxley, e Laranja Mecânica, de Anthony Burgess, são clássicos do século de
guerra e conflitos como o passado, e premonitórios para o atual.
Com Julia, Parsons, Syme e o principal Winston
Smith, Orweel desenrola um enredo pós-guerra de regime totalitário sem
precedentes em que, nem mesmo, a resistência é autônoma. Em um partido
homogêneo, cada personagem tem a sua atribuição bem definida pelos ministérios
imaginados por Orwell e comandados pelo Grande
Irmão. Entre essas atribuições a de Syme
e Winston são fundamentais para a
manutenção da engrenagem manipulatória do Big
Brother.
Syme é responsável
por uma suposta reforma no vocabulário do Partido, já Winston sob o lema de que “quem
controla o presente, controla o passado e quem controla o passado, controla o
futuro”, trabalha intensamente em
reescrever fatos históricos e, até mesmo, cotidianos de todos os controlados
pelo sistema. Curiosamente, o oficio de Winston
é apagar, ou melhor, subverter e confundir àqueles que, com dificuldade, detêm
a memoria, recordações de um tempo pré totalitário, os mais experientes, cascudos,
mais velhos. Em contrapartida, dos mais novos, o sistema não exige uma atenção
tão especial, já que eles são “naturalmente” instruídos a não se atentarem ao
passado e seguirem como um ferrenho exercito contra possíveis contraventores.
Na onda da memória, a cognição em recordar através
armazenamentos, por vezes físicos ou das redes de servidores, já foi menos
tênue que nos últimos meses. Até pouco, a lógica de rede social baseava-se em
publicar e compartilhar. Publicar partindo do pressuposto de ter algo para tal
e compartilhar para expandir e se auto realizar-se.
O advento das “histórias”, nomenclatura dada ao novo método
que as redes sociais desenvolveu para facilitar o compartilhamento de momentos,
cada vez mais, privativos e descontraídos de seus usuários, duráveis apenas por
24 horas, um dia, além de fomentar a discussão sobre os limites que fogem de
qualquer parâmetro de privacidade, levantou, ainda que em um primeiro momento,
a ideia de que um possível Partido, assim como na obra de Orwell, estaria,
simplesmente, modificando a regra de publicar/compartilhar para apenas
compartilhar sem guardar, sem armazenar, sem dar a possibilidade de recorrer a
esses momentos, nem mesmo, como lembranças ou recordações.
Tão atual quanto o tempo presente, Orwell ainda dizia, sem
muita esperança, que a revolução só seria possível caso o proletariado tomasse
parte do que realmente lhe pertence. 68 anos depois, a "prole" ainda não percebeu
e, às vezes, mesmo o Gregoriano afirmando que estamos em 2017, o britânico
reaparece com o auxilio do “Partido Trump” e nos convoca a reconhecer o nosso
estágio: 1984.
Brilhante, parabéns.
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