Enquanto alguns poucos estavam felizes abrindo presentes, ainda confraternizando com parentes, outros muitos exerciam suas duras obrigações de trabalho. Imposto ao 25 de dezembro como o dia do nascimento, do advento, da salvação para os crentes em Cristo e à supérflua felicidade promovida pela troca de bens materiais, o Natal está longe de ser igual à todos. O último, por exemplo, foi, no mínimo, desolador para a família de Luiz Carlos Ruas, vendedor ambulante das entradas da estação Dom. Pedro II, na zona central de São Paulo, e que carinhosamente era conhecido como "Índio".

Imagem: Jornalistas Livres

No alto de seus 54 anos, sendo 20 desses ali naquela região, Índio, segundo relatos, estava para ir embora quando se deparou com uma cena recorrente e que levanta muita discussão, um bate boca entre dois jovens e um morador de rua homossexual. Ainda de acordo com relatos, um dos rapazes, sem pudor algum, urinou na frente de todos, uma cena que causaria incômodo à qualquer um, mas que pouquíssimas pessoas teriam coragem de intervir ou falar algo, ainda mais sabendo que um deles portava um soco inglês na mão.
Bem distante dessa lógica, de forma corajosa e audaciosa, bem peculiar de alguém que luta contra um dos maiores males da Humanidade, já discutido por Platão há milhares de anos em o "Mito da Caverna", quando estar dentro dessa caverna é também considerado conservadorismo, o morador de rua homossexual resolveu falar, reclamou da situação e em troca recebeu a ação da intolerância, os muitos xingamentos e pontapés.
Diante disso, Índio quis lutar, foi a frente na defesa, não de um homossexual, mas do correto, já que a ação de urinar em público é, no mínimo, falta de respeito e educação.
Índio foi duramente espancado pelos dois jovens.
Índio, na esperança de encontrar alguém que pudesse ajuda-lo correu para o interior da estação.
Índio esperava ajuda, até mesmo, dos omissos e perseguidores de trabalhadores honestos, os agentes de segurança do Metrô que só chegaram uma hora depois do ocorrido.
Índio, assim como do lado de fora, quando o morador de rua foi o único a falar algo sobre a desrespeitosa ação dos rapazes, apenas deu de cara com mais espectadores.
Índio morreu e pagou por estar, em apenas um dia, dia de Natal, mesmo que por aquele momento, do lado de um morador de rua homossexual, além de ser um marginalizado ambulante.

Índio esteve, até a sua morte, do lado "errado" da sociedade. O lado dos segregados e oprimidos.

Sua viúva e companheira de trabalho só não estava com ele quando houve o homicídio, por estar em casa preparando, devido a data, um jantar especial, uma ceia singela, já que eles só tinham um ao outro.
Compartilhe:

Claudio Porto

Jornalista independente.

Deixe seu comentário:

1 comments so far,Add yours

  1. É Claudio, infelizmente fatos como esse acontecem e na invisibilidade do pobre brasileiro, com muito mais frequência do que possamos imaginar, este caso veio á tona por conta de ser num local de grande movimento, mas há muitos casos assim que nem são noticiados.

    Sua explanação foi brilhante, esses tipos de SERES (que na minha visão não são "humanos") que cometem tais barbáries, se julgam por (talvez) serem de uma "classe social" (ou seja, são idiotas) "diferente", creem com isso ser de uma "casta" diferente, "superior" em relação ao desfavorecido, ou em relação (como neste caso) a quem tem outra sexualidade que não a "comum" ou quem tem uma deficiência, ou quem é gordo, ou quem tem sotaque, enfim. E nisso se julgam "no direito" de cometer atos como esse, é triste que em 2016 vejamos isso e pensar que isso não retrocede, ao contrário, quanto mais acesso ás informações a sociedade tem, mais preconceito, mais ódio, mais o instinto animalesco (que me desculpem os animais) de alguns seres vivos bípedes aflora.

    Esse caso me deixou especialmente chocado, pois na minha vida, sempre que precisei, sim, trabalhei como ambulante e não me sinto em nada depreciado por isso. E numa situação como esta, eu teria A MESMA postura de Índio, poderia ser eu, morto agora, enfim, é muito doloroso.

    ResponderExcluir